segunda-feira, 16 de março de 2009

Demanda subtil aos editores que se prezem

Hoje o Blogtailors abriu o dia com um post de opinião de José Alfaro (*) com o saboroso título de ALGUMAS LINHAS SOBRE A NOBRE PROFISSÃO DE EMPREGADO DE LIMPEZA (A QUEM ALGUNS TAMBÉM CHAMAM ESCRAVO, CAPACHO OU REVISOR).

O título faz adivinhar o que se segue, e o que se segue é uma justa catilinária contra alguns dos mais prejudiciais lugares-comuns do mundo da edição, a saber, que basta conhecer bem uma língua estrangeira para se ser tradutor e que basta escrever bem em português ou ter uma licenciatura em Línguas e Literatura para se ser revisor.

Aparentemente, os destinatários da mensagem são as inúmeras pessoas que se consideram com conhecimentos suficientes para exercer a actividade ("só a total desconsideração pela actividade pode justificar que qualquer um se julgue com capacidades para ser revisor"), contribuindo, com essa despreocupada irresponsabilidade, para a desproporcionadamente baixa valorização da profissão de editor (no sentido do editing) e revisor de texto.

O autor descreve em traços largos mas nítidos as qualidades e competências necessárias para o exercício da profissão, singularidades que a afirmam como elo valorizador e não desprezável da cadeia de valor da edição. e convida todos os que se sentem vocacionados ou atraídos pela actividade a pensarem-na em termos profisionais, autoavaliando o talento e as competências próprias e procurando desenvolver ambos usando as ferramentas formativas que lhes permitirão desempenhar com qualidade a função.

Acredito, porém, que a queixa amarga que o José Alfaro expressa no título da sua opinião tem destinatários menos evidentes mas bem mais elevados na hierarquia da edição. Porque a oferta de trabalho é livre, mas a contratação de profissionais ou de amadores bem intencionados é feita pelas casas editoriais, seja por editores-assalariados seja por editores-patrões. A desvalorização mais grave da profissão de editor de texto e ou revisor é feita por aqueles que têm o poder de decidir que grau de qualidade pretendem nos seus livros, que grau de qualidade pretendem oferecer ao público, e optam pelo amadorismo em detrimento do profissionalismo - por razões que só eles podem explicar.

Como é habitual, as mudanças comportamentais não se fazem por decreto. E não servirá apenas, embora ajude muitíssimo, mudar o comportamento e o funcionamento de largo número de editores. Aqueles que estão virados para o que se convencionou chamar "um mercado de massas" descobriram há alguns anos que não precisavam de manter um rigoroso trabalho de edição e revisão para leitores de gosto pouco formado. Por isso será preciso, ainda, que mude também a educação dos leitores, que é algo que se constrói com a própria leitura, como o gosto, e que se espera os venha a tornar conscientes dos seus direitos e capazes de exigir obras bem feitas, reclamando a uma casa editora por um livro mal feito da mesma forma que são capazes de reclamar num restaurante por um mau serviço.

Em boa hora o Blogtailors publicou o comentário desassombrado do José Alfaro. Além de editor de mérito, tem sido o impulsionador de acções formativas e de profissionalização no mundo editorial, com particular destaque para as de edição e de revisão de texto.

Os jovens e menos jovens que queiram dedicar-se a estas profissões devem perceber a vantagem competitiva que lhes é concedida por cursos e outras acções formativas como as que o José Alfaro ou os Booktailors promovem. Mas para que a utilização desses recursos profissionais se generalize será imprescindível que as empresas editoriais partilhem do mesmo critério de responsabilidade e exigência manifestados pelo autor e que dêem preferência, nas suas escolhas de colaboradores, a currículos que contenham ou um saber de longa e comprovada experiência ou, quando se trate de quadros novos, demonstrem um mínimo formativo indispensável. E aí, há um longo caminho a percorrer por muitas empresas editoriais.

Procurem no Blogtailors o artigo completo. Está lá, e vale a pena ler.
MSL

(*) Editor da Quimera Editores e coordenador dos cursos de pós-graduação e de formação avançada em edição da Faculdade de Ciências Humanas da UCP.

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